sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Canção óbvia

Escolhi a sombra desta árvore para
repousar do muito que farei,
enquanto esperarei por ti.
Quem espera na pura espera
vive um tempo de espera vã.
Por isto, enquanto te espero
trabalharei os campos
e conversarei com os homens.
Suarei meu corpo, que o sol queimará;
minhas mão ficarão calejadas;
meus pés aprenderão o mistério dos caminhos;
meus ouvidos ouvirão mais;
meus olhos verão o que antes não viam;
enquanto esperarei por ti.
Não te esperarei na pura espera
porque o meu tempo de espera é um
tempo de quefazer.
Desconfiarei daqueles que virão dizer-me,
em voz baixa e precavidos:
É perigoso agir
É perigoso falar
É perigosos andar
É perigoso esperar na forma como esperas,
porque êsses recusam a alegria da tua chegada.
Desconfiarei também daqueles que virão dizer-me,
com palavras fáceis, que já chegaste,
porque esses, ao anunciar-te ingenuamente,
antes te denunciam.
Estarei preparando a tua chegada
como o jardineiro prepara o jardim
para a rosa que se abrirá na primavera

Paulo Freire, março de 1971

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