sexta-feira, 23 de maio de 2008


Por hoje é só
um pé descalço
um samba mudo e imaginado
uma vida morna
meio sem graça
dias incolores
ânsias abdominais de calores.

Sorrio a saudade de um membro impositor
Choro por um corpo palhaço
abandonado em lonas promocionais
Planejo uma fuga

Qualquer hora também embarco
para cheirar madeira velha de vagões
beber vinhos chilenos
envelhecer brindando soluços
abraçada uma pelúcia embolorada
esquecida de armários maternos.


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Todas as coisas de que falo estão na cidade
São todas elas coisas perecíveis e eternas como o teu riso
a palavra solidaria, a minha mao aberta
ou este esquecido cheiro de cabelo que volta...
Todas as coisas de que falo são de carne como o verão e o salário.
Mortalmente inseridas no tempo,
estão dispersas como o ar no mercado, nas oficinas, nas ruas, nos hotéis de viagem.
São coisas, todas elas, cotidianas, como bocas e mãos, sonhos, greves, denúncias, acidentes do trabalho e do amor.
Coisas, de que falam os jornais às vezes tão rudes ás vezes tao escuras
que mesmo a poesia as ilumina com dificuldade.
Mas é nelas que te vejo pulsando, mundo novo
ainda em estado de soluços e esperança.


(F.G)

roubado da stelinha
img: bear abstract

.turbulências.


.ando abrindo portas. a maioria nem sabia que estavam lá. num meio de texto me vejo tocando trinco. girando chave. adentrando.

.[mentira. nem sempre entro. às vezes fico na soleira. a cara acesa com medo de mergulhar no escuro do aposento].

.entrar significa entregar-se ao súbito alheiamento. à deriva bendita que pinica epifanias. entrar também significa desembaçar espelhos. onde um outro devolve assombro e olhar. às vezes há conversa - ou tentativa de conversa - com esse outro. esfacelamento de muros e poda de espinhais. mas na maioria dos confrontos/encontros é um mútuo mudo espanto.

.queria poder levar alguém comigo quando passasse pela próxima porta. alguém que não se importasse de me ver extremo e abismo. quem pudesse me segurar a mão e dizer baixinho "sem pressa. já saberemos". ou que estivesse apenas do lado e olhasse como quem diz "também estou vendo".

.tenho aberto portas pesadas. paquidérmicas. emperdenidas. portas sufoco sem paz. tenho aberto portas transparentes e transpassáveis. vaporosas. inefáveis. portas fuga de esquecimento. e tenho aberto portas nebulosas. opacas. imperscrutáveis. portas silêncios nervais.

.agora mesmo - enquanto te digo isso - estou passando por uma. entrando fundo no mundo de penumbra que um arco esmaecido guardava e cumpria. preciso de ajuda aqui. não consigo enxergar.

.me empresta teu olhar?.


paulo amoreira: http://exlibris.zip.net/


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sábado, 10 de maio de 2008

Luz Sonora


" Nós cientistas e poetas procuramos
A prova, o ponto, o encontro
O momento, do limite
Entre o ser e o não ser

Queremos a verdade a intensidade
Olhar para o instante singular
Onde a grande escuridão
Transborda estrelas e sois
Tom luminoso
Luz sonora
A mão de Deus
Modela o tempo
Em eras e momentos
De pulsar constante

E do infinito
cria o finito
Do eterno
O passageiro

Nós cientistas e poetas lapidamos
Palavras sons e cores equações
Que traduzam o não saber
Do viver e morrer"


Marcelo Petraglia

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Iluminuras


O escuro é azul luzal luzindo zuindo zuando em teus oinhos de jade
Tua alma é de carne carnuda rainha inundada de brasa e lenho
Tua dor é escura minha dor é escura nossa dor é azul martírio
Teu sorriso é um abismo em teu escuro me atiro e o abismo é azulidão
Meu azul é escuro porque a lua é azul porque assim tu queres
Teu azul é uma luz no escuro do quarto passa um rio sem fim.

Tonico Mercador

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